Os Pioneiros
Décadas de 1930 e 1950
Pesquisa e texto Os primeiros 781 imigrantes japoneses que desembarcaram há exatos cem anos em Santos, São Paulo, em busca de nova vida, inauguraram uma profícua inseminação mútua de costumes, esforços e tradições, que se estende até o presente. O intenso choque da adaptação, a vida tão diversa, os sacrifícios focados no futuro e o estranhamento sentido e sofrido por esses quase “alienígenas”, não impediu que rapidamente começassem a influênciar e deixarem-se influênciar pela arte e o ambiente cultural brasileiro. Já na década seguinte à primeira leva de imigração, chegaram ao país alguns dos mais significativos representantes da geração que viria a ser conhecida pela formação do Grupo Seibi, ou, em japonês, Seibi-kai (Grupo de Arte de São Paulo, sendo ‘Sei’ a abreviação do nome da cidade, ‘bi’, arte, ‘kai’, grupo), fundado em 1935 por Tomoo Handa (Utsonomyia, 1906 – Atibaia, 1996), o pioneiro entre os filhos do Japão – e futuros artistas – a aportar no Brasil, em 1917. Foram alguns de seus companheiros, entre os oito artistas fundadores: Yoshiya Takaoka (Tokyo, 1909 – São Paulo, 1978), Yuji Tamaki (Fukui, 1916 – São Paulo, 1979), Walter Shigeto Tanaka (Kumamoto, 1910 – São Paulo, 1970) e os que integraram na reabertura em 1947, como Manabu Mabe (Kumamoto, 1924 – São Paulo, 1997), Alina Okinaka (Hokkaido, 1920 – São Paulo, 1991), todos eles radicados em São Paulo, tendo a maioria aqui estudado e tido os primeiros contatos com a arte. Alguns, vindos já adultos, apresentavam diferentes graus de educação e formação artística do país de origem, como Massao Okinaka (Kyoto, 1913 – São Paulo, 2000) e Tikashi Fukushima (Fukushima, 1920 – São Paulo, 2001). A chegada ao país, em 40, do já consagrado pintor e moldureiro Tadashi Kaminagai, (Hiroshima, 1898 – Paris, 1982) residente na França, infunde nova vida, ânimo e fôlego à obra e às aspirações do grupo. Sua arte, compartilhada na feitura, nos temas e nos objetivos, distinguia-se no ambiente vigente pela rejeição ao academicismo e pela adesão às pesquisas da vanguarda européia pósimpressionismo somada à marcante riqueza da visualidade japonesa, mantida ao mesmo tempo íntima e generosamente explosiva, preservada nos resíduos afetivos e culturais da infância anterior ao Brasil. O ingrediente novo que selaria definitivamente a configuração do trabalho desses artistas seria a paisagem brasileira, a luz tropical, a exuberância transbordante e onipresente do colorido na natureza, na gente, na arte. A prática da pintura em estúdio, com modelos vivos (muitas vezes os próprios artistas, que se retrataram mutuamente, com grande freqüência) somava-se a viagens em grupo, tanto pelos entornos da cidade de São Paulo, como pelo interior dos estados de São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Pará, Amazonas e especialmente Bahia, onde o acolhimento dos artistas locais e a cor africana dos costumes somada à tradição barroca de primeira capital, exerceu sobre eles incomparável encanto. Também os hábitos e a vida dos ‘caboclos’ e ‘caipiras’ brasileiros, sua relação com a natureza, seu despojamento, frugalidade, religiosidade e simples humanidade eram fonte unânime de inspiração e admiração. Os países vizinhos, em especial Peru e Bolívia, foram igualmente objeto de sua curiosidade e fascinação. A atuação dos nipo-brasileiros deixou clara, mais uma vez, o quão ampla e franca era sua abertura ao ambiente local, com a fusão de alguns dos membros do grupo Seibi aos do eminentemente italiano Santa Helena (assim chamado por sediar-se no palacete do mesmo nome, no centro de São Paulo, demolido nos anos 70), e que se denominou Grupo Guanabara (nome de um antigo largo no bairro do Paraíso – onde originalmente se situava o atelier de molduras de Fukushima, seu principal articulador – que deu lugar a uma estação do metrô). O Seibi produziu ativamente, gerando obras que hoje atestam seu vigor em diversos museus, principalmente na imensamente representativa coleção da Pinacoteca do Estado de São Paulo, no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, no Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil, no Instituto Manabu Mabe, na Coleção Mário de Andrade da USP, no Museu de Arte Nipo-Brasileira (todos em São Paulo), no Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, e no K.K.K.K. Memorial da Imigração Japonesa de Registro, SP. Ainda em vida, Manabu MABE amealhou acervo precioso e muito significativo de trabalhos do Seibi-kai, que hoje compõem a coleção do instituto que leva o nome do artista e que será instalado em breve em sede própria, no bairro da Liberdade, São Paulo. |
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